Não é a primeira vez que escrevo
aqui no blog sobre essa pergunta tão insondável, o que não é de espantar, visto
que até hoje ninguém deu uma resposta aceitável para esse questionamento
secular. Enquanto a vida vai passando, a gente não desiste, no entanto,
encontrar uma explicação que nos conforte porque nós, seres humanos, precisamos
de justificativa para tudo, precisamos compreender, acima de tudo, quem somos e
o que fazemos aqui, questões que precisam ser refletidas de vez em quando para
que não nos percamos nas areias do tempo, sob pena de, quando olharmos para
trás, perceber que a vida chegou ao fim e nada de importante foi feito dela.
Existe algo mais desesperador do que a constatação de que você viveu e não foi
útil em nada durante todo o tempo que passou nesse plano? Por isso a gente se
pergunta tanto, porque queremos que a nossa vida faça sentido, não é mesmo?
Essa semana uma das muitas reflexões
sobre esse assunto prendeu a minha atenção. Um dos personagens da série True
Detective disse o seguinte:
“Nós somos objetos que agem sob a ilusão
de termos um ser, uma criação de experiência sensorial e sentimento,
programados com total certeza de que cada um de nós é alguém, mas na verdade,
ninguém é ninguém. A única coisa honrosa que nossa espécie pode fazer é negar
nossa programação e parar de se reproduzir (...)” (True detective, season 1,
episode 1)
Tais palavras me remeteram à teoria de
Richard Dawkins em seu clássico O gene
egoísta, que nos coloca como sendo apenas máquinas para a sobrevivência de
nossos genes. Dawkins era um estudioso do evolucionismo e defendia que nós, indivíduos,
somos passageiros, mas os genes são eternos e habitam nosso corpo fazendo-nos achar
que somos nós que o controlamos, quando na verdade eles nos guiam como por
controle remoto. O objetivo dos genes é simplesmente se replicar, garantir a sobrevivência
dentro de uma máquina que será abandonada não servir mais, quando alcançar o
ápice da senilidade
“Eles estão em mim e em você. Eles nos
criaram, corpo e mente. E sua preservação é a razão última de nossa existência.
Transformaram-se, esses replicadores, agora eles recebem o nome de genes e nós
somos suas máquinas de sobrevivência.” (Richard Dawkins, O gene egoísta)
Confesso que esse discurso me parece um
tanto determinista e, por esse motivo, não me agrada tanto. Porém não vou negar
que as pesquisas de Richard Dawkins são relevantemente importantes e possuem
seu fascínio. Eu diria até que, talvez, ela seja a explicação para a desordem
que nos leva a agir como se ás vezes não fossemos nós, mas outro, atuando sobre
nossa vontade. É assim que acontece, por exemplo, quando estamos apaixonados.
Agimos guiados por sentimentos excessivamente emotivos, sofremos quando
distantes da pessoa amada, somos plenamente felizes em sua presença e somos
acometidos de toda sorte de desgaste físico mascarados de uma profunda sensação
de bem estar da qual não queremos nos desprender jamais. Perdemos o sono, o
apetite e a dignidade, nos tornamos ridículos em razão de nosso objeto de amor
e desejamos ficar assim para sempre. Tudo culpa da Dopamina, uma substância
química produzida em maior quantidade quando estamos nesse estado de êxtase.
Entretanto, muitos estudiosos concordam que não é saudável se manter apaixonado
por muito tempo, já que, nesse período, se deixa de viver a vida. Alguns vão
além. Segundo o psiquiatra norte americano James Leckman, da universidade de
Yale, é biologicamente impossível alguém se manter apaixonado por, digamos, dez
anos. Ninguém aguentaria ficar tanto tempo sem comer ou dormir e isso nos dá
uma dimensão de quanto poder a paixão pode exercer em nosso cérebro, portanto
acredita-se que ela dure, em média, dois anos.
Mas porque dois anos? Por que não um? Ou
três?
Porque esse é o tempo médio necessário
para perpetuar a espécie, ou seja, para repassar os genes para outra geração.
Isso mesmo. Para alguns psicólogos evolucionistas o amor romântico, ou paixão,
tal como a conhecemos, é um mecanismo criado por nossos genes para garantir a
reprodução da espécie. Isso significa dizer que nossos genes (espertinhos), não
podem deixar a necessidade da perpetuação à mercê da boa vontade de homens e
mulheres incautos. É preciso assegurar que a reprodução aconteça, de uma maneira
ou de outra, por isso surgiu a atração física, feromônios, atributos para
seduzir o sexo oposto e tantas outras qualidades as quais não damos
importância. Para os genes, tudo isso tem um propósito único e exclusivo:
perpetuação.
Se pensarmos em nós mesmos como
imensos robôs que servem de moradia para os genes, fica difícil encontrar uma
resposta para a pergunta que nos trouxe até aqui. Como em toda situação
paradoxal, acho que a saída é não polarizar. Não vamos ser deterministas a
ponto de nos entregar e deixar nossa existência ao acaso ao sabor da corrente,
abrindo mão de escolher o bem que podemos fazer enquanto estamos aqui. Mas
também não sejamos severos demais colocando nas costas a culpa por nossa vida
não ser como gostaríamos. Eu prefiro pensar que a cada replicação se formam
genes maiores e mais complexos e que, por esse motivo, as próximas gerações serão
melhores que a nossa. Você já reparou como está o mundo lá fora? Quando tudo
estiver verdadeiramente perdido, a natureza vai se encarregar de nós. E aí
talvez a gente descubra que o sentido da vida é ter sentido nenhum.